Aquilino é que sabia

Se alguém tratou bem o Porto foi Aquilino Ribeiro, que sobre ele escreveu páginas memoráveis. E, não sendo portuense, tinha a noção do valor para o Burgo, daquilo a que se chamaria Centro Histórico e Baixa. Disso dá conta em 1952, ao dizer: «Que esplêndida cidade não é o Porto para quem mora entre a Constituição e a Ribeira!» Não por acaso a (ressuscitada?) SRU definiria este espaço como prioritário da sua intervenção.

Infelizmente para os que suportam os custos de tais decisões, os planificadores, urbanizadores e políticos dos anos 60 e 70 não pensavam como Aquilino. Estiveram-se nas tintas para o Centro Histórico (que já tinham, na Sé, começado a arrasar), projectando a destruição do Barredo e a construção de um Silo-Auto. E, mais do que nas tintas, detiveram-se nos cálculos do rendimento especulativo dos solos e edifícios, ao declararem a Baixa destinada à banca, empresas, escritórios, serviços.

Em nome disso, fora com os cafés, cinemas, restaurantes, comércio e, sobretudo, residentes, desterrados, deportados, centrifugados para a periferia. A maioria para fora da cidade. Adeus Baixa. E as consequências de meio século de políticas de incompetência e conivências espúrias entre gestão urbana e interesses financeiros estão à vista: a «esplêndida cidade» de Aquilino transformou-se num território agónico, despovoado, arruinado e maltratado.

Mas como o espírito da cidade parece renascer em alturas inesperadas, a Baixa (da Ribeira ao Marquês, das Fontainhas ao Palácio) começou a dar a volta. Nesta hora de Renascimento Urbano, reabilitar, renovar e repovoar constituem as palavras de ordem do reencontro da cidade com a sua História. Do reencontro dos tripeiros que não se resignaram nem abdicaram com a urbe (e, se calhar, consigo próprios).

2014©helderpacheco

~ por Helder Pacheco em 2014-08-02.