Tony, Good bye

Jorge Luís Borges escreveu: «Somos o tempo.» Eu, sem me querer comparar, acrescentaria que estamos no tempo. Vivemos nele e, de repente, foge-nos.
Ademais, é o guardião de quanto acumulamos: alegrias,desgostos, vitórias, derrotas, ambições, desencantos, esperanças e frustrações. Tudo se encontra no arquivo dos dias. Mas, guardião insidioso, é também o ladrão da nossa vida, da infância ao entardecer. Até à noite que, subitamente, nos assalta. Tudo vamos deixando para trás. Como os amigos que partiram.
Levou-me quase todo o património. Sem remissão. Começou, há 50 anos, com o Escultor Brito Mesquita e não mais parou: Luís Lousada Soares, Emílio Peres, Álvaro Ferreira Alves, o Senhor João Alfaiate, o Dr. Pimenta, a Ilda e o Vasco Morais Soares, Albano Martins, João Semedo, Jorge de Melo, Luísa Dacosta, Manuel Magalhães, Miguel Veiga, João Duarte, Élio Terrível, Rebordão Navarro, Júlio Couto, Benjamim Veludo e, há dias, a Maria Aurora.
Perdi agora um amigo especial, dos que nos enche as horas com a felicidade efémera mas consistente: Tony Bennett. Através das canções, ofereceu-me momentos de absoluto deleite, prazer e tranquilidade. Vi-o e ouvi-o, há 30 anos, no Royal Albert Hall. Fiquei freguês. Há quase 20 anos, ouvi-o no Europarque, na Feira. E, há talvez uma dúzia (o tempo voa, «time flyes», cantava), na ExpoNorte. Sempre euforico, como se o seu tempo não contasse. Puro engano, afinal contava e, para nosso desgosto, extinguiu-se.
Numa canção, dizia Tony que dele tinham sido todas as boas coisas da vida («The Good Things in life were all mine». E repartiu-as connosco.

~ por Helder Pacheco em 2023-12-24.